Meu nome é João. Nome comum
para pessoa comum. Vida comum, pensamentos comuns, amizades comuns. Tudo na
minha vida é comum, exceto meu trabalho. Sou um abraçador de gente! Muitos falam que esse
trabalho é cansativo, estressante, sem
remuneração, e o pior, sem estabilidade! Pois é. Mas eu penso diferente.
Eu tenho um parceiro que
trabalha comigo todos os dias. Viramos amigos, viramos irmãos. Fazemos hora
extra todo dia e trabalhamos duro. Nessa empresa tem até plano de carreira! Mas
nem por isso é fácil. Nem todas as pessoas querem ser abraçadas. E ser abraçado
muitas vezes também é abraçar. Nem todos estão dispostos a abraçar pessoas, nem
na primeira hora da manhã nem na última. Nem se fossem pagos para fazer isso,
como eu sou. Mas não se engane, não faço isso por dinheiro, faço por amor. Amo
o que faço porque faço o que amo e isso basta pra mim.
Uma vez estava parado no
sinal, que estava prestes a abrir e vi pelo retrovisor uma mulher descabelada
correndo para me alcançar a tempo. Meus outros colegas de trabalho a ignorariam
e pisariam no acelerador, mas eu não. Abri gentilmente a porta do ônibus e a
mulher entrou surpresa, sendo abraçada por mim, pelas portas do meu ônibus, que
são praticamente meus braços.
A tal mulher, muito
agradecida, começou a me contar sobre a sua vida. Era mãe viúva. O falecido
deixara um grande legado para ela. Oito filhos. Ela trabalhava como atendente
de telemarketing e ganhava um salário mínimo. Era feliz.
No meu trabalho é comum
encontrar pessoas incríveis que estão sempre prontas para compartilhar fatos
interessantes e relevantes sobre suas vidas. A minha teoria é que para alguém
começar a falar, basta ter alguém próximo para escutar. Sou um bom ouvinte e
por isso tenho muita história pra contar, mesmo não sendo minhas.
Um dia numa terça-feira, às
quatro e treze da tarde abracei um sujeito muito simpático. Parecia irritado,
tinha um olhar ameaçador e falava palavras grosseiras. Disse algo como
"passa a grana", me deu um carinhoso soco na barriga, em seguida
pegou muito dinheiro emprestado com o meu parceiro e saiu muito apressado.
Alguns segundos depois
percebi que aquele soco havia me perfurado. Havia ganhado um tiro. Quanta
consideração do rapaz simpático! Ouvi alguns gritos de alegria, e em seguida
tudo começou a virar um borrão. Acho que estava tendo uma crise de labirintite,
deve ser isso mesmo. O que era muito ruim, já que possivelmente perderia o
sanduíche e o suco de abóbora que eu e meu parceiro dividíamos no final da
nossa jornada.
Acho que ouvi alguém dizer
algo sobre ser finalmente abraçado. Mas como eu disse mais acima, abraçar
também é ser abraçado. Ouvi também que eu seria abraçado por alguém que seria
muito generoso comigo e me levaria para tirar férias em um lugar supimpa.
Depois descobri que na verdade me demitiram por justa causa, perdendo assim
todos os meus direitos e minha grana rescisória.
Quando tive tempo para pensar
em como ia me virar sem o seguro desemprego, me abraçaram.
Nota póstuma: nunca confie
nas terças-feiras.
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